terça-feira, 29 de outubro de 2013

A Relevância da Reforma

 A Relevância da Reforma
A Reforma Protestante do século XVI foi um fenômeno variado e complexo, que incluiu fatores políticos, sociais e intelectuais. Todavia, o seu elemento principal foi religioso, ou seja, a busca de um novo entendimento sobre a relação entre Deus e os seres humanos. Nesse esforço, a Reforma apoiou-se em três fundamentos ou pressupostos essenciais:
1. A centralidade da Escritura
Os reformadores redescobriram a Bíblia, que no final da Idade Média era um livro pouco acessível para a maioria dos cristãos. Eles estudaram, pregaram e traduziram a Palavra de Deus, tornando-a conhecida das pessoas. Eles afirmaram que a Escritura deve ser o padrão básico da fé e da vida cristã (2 Tm 3.16-17). Todas as convicções e práticas da Igreja deviam ser reavaliadas à luz da revelação especial de Deus. Esse princípio ficou consagrado na expressão latina “Sola Scriptura”, ou seja, somente a Escritura é a norma suprema para aquilo que os fiéis e a Igreja devem crer e praticar. Evidentemente, tal princípio teve conseqüências revolucionárias.
2. A justificação pela fé
Outro fundamento da Reforma, decorrente do anterior, foi a redescoberta do ensino bíblico de que a salvação é inteiramente uma dádiva da graça de Deus, sendo recebida por meio da fé, que também é dom do alto (Ef 2.8-9). Tendo em vista a obra expiatória realizada por Jesus Cristo na cruz, Deus justifica o pecador que crê, isto é, declara-o justo e aceita-o como justo, possuidor não de uma justiça própria, mas da justiça de Cristo. Essa verdade solene e fundamental foi afirmada pelos reformadores em três expressões latinas: “Solo Christo”, “Sola gratia” e “Sola fides”. Justificado pela graça mediante a fé, e não por obras, o pecador redimido é chamado para uma vida de serviço a Deus e ao próximo.
3. O sacerdócio de todos os crentes
A Igreja Medieval era dividida em duas partes: de um lado estava o clero, os religiosos, a hierarquia, a instituição eclesiástica; do outro lado estavam os fiéis, os leigos, os cristãos comuns. Acreditava-se que a salvação destes dependia da ministração daqueles. À luz das Escrituras, os reformadores eliminaram essa distinção. Todos, ministros e fiéis, são o povo de Deus, são sacerdotes do Altíssimo (1 Pedro 2.9-10). Como tais, todos têm livre acesso à presença do Pai, tendo como único mediador o Senhor Jesus Cristo. Além disso, cada cristão tem um ministério a realizar, como sacerdote, servo e instrumento de Deus na Igreja e na sociedade. Que esses princípios basilares, repletos de implicações revolucionárias, continuem sendo cultivados e vividos pelos herdeiros da Reforma.
Autor: Rev. Alderi Souza de Matos
Fonte: Página da História da Igreja do autor

sábado, 26 de outubro de 2013

DEUS

Então o Senhor me disse: "É mentira o que os profetas estão profetizando em meu nome. Eu não os enviei nem lhes dei ordem nenhuma, nem falei com eles. Eles estão profeti­zando para vocês falsas visões, adivinhações inúteis e ilusões de suas próprias mentes". 
Jeremias 14:14
E entre os profetas de Jerusalém
vi algo horrível:
eles cometem adultério e
vivem uma mentira.
Encorajam os que praticam o mal,
para que nenhum deles se converta
de sua impiedade.
Para mim são todos como Sodoma;
o povo de Jerusalém é como Gomorra." 
Jeremias 23:14
"Envie esta mensagem a todos os exilados: Assim diz o Senhor sobre Semaías, de Neelam: Embora eu não o tenha enviado, Semaías profetizou a vocês e fez com que vocês cressem numa mentira, 
Jeremias 29:31
Suas visões são falsas; suas adivinhações, mentira. Dizem 'Palavra do Senhor', quando o ­Senhor não os enviou; contudo, esperam que as suas palavras se cumpram. 
Ezequiel 13:6
Só se veem maldição, mentira
e assassinatos,
roubo e mais roubo,
adultério e mais adultério;
ultrapassam todos os limites!
E o derramamento de sangue
é constante. 
Oséias 4:2
"Vocês pertencem ao pai de vocês, o Diabo, e querem realizar o desejo dele. Ele foi homicida desde o princípio e não se apegou à verdade, pois não há verdade nele. Quando mente, fala a sua própria língua, pois é mentiroso e pai da mentira. 
João 8:44
Trocaram a verdade de Deus pela mentira, e adoraram e serviram a coisas e seres criados, em lugar do Criador, que é bendito para sempre. Amém. 
Romanos 1:25
Alguém pode alegar ainda: "Se a minha mentira ressalta a veracidade de Deus, aumentando assim a sua glória, por que sou condenado como pecador?" 
Romanos 3:7
Portanto, cada um de vocês deve abandonar a mentira e falar a verdade ao seu próximo, pois todos somos membros de um mesmo corpo. 
Efésios 4:25
Por essa razão Deus lhes envia um poder sedutor, a fim de que creiam na mentira 
2 Tessalonicenses 2:11
Não escrevo a vocês porque não conhecem a verdade, mas porque a conhecem e porque nenhuma mentira procede da verdade. 
1 João 2:21
Mentira nenhuma foi encontrada na boca deles; são imaculados. 
Apocalipse 14:5
Fora ficam os cães, os que praticam feitiçaria, os que cometem imoralidades sexuais, os assassinos, os idólatras e todos os que amam e praticam a mentira. 
Apocalipse 22:15

terça-feira, 22 de outubro de 2013

A Relevância da Reforma

A Reforma Protestante do século XVI foi um fenômeno variado e complexo, que incluiu fatores políticos, sociais e intelectuais. Todavia, o seu elemento principal foi religioso, ou seja, a busca de um novo entendimento sobre a relação entre Deus e os seres humanos. Nesse esforço, a Reforma apoiou-se em três fundamentos ou pressupostos essenciais:
1. A centralidade da Escritura
Os reformadores redescobriram a Bíblia, que no final da Idade Média era um livro pouco acessível para a maioria dos cristãos. Eles estudaram, pregaram e traduziram a Palavra de Deus, tornando-a conhecida das pessoas. Eles afirmaram que a Escritura deve ser o padrão básico da fé e da vida cristã (2 Tm 3.16-17). Todas as convicções e práticas da Igreja deviam ser reavaliadas à luz da revelação especial de Deus. Esse princípio ficou consagrado na expressão latina “Sola Scriptura”, ou seja, somente a Escritura é a norma suprema para aquilo que os fiéis e a Igreja devem crer e praticar. Evidentemente, tal princípio teve conseqüências revolucionárias.
2. A justificação pela fé
Outro fundamento da Reforma, decorrente do anterior, foi a redescoberta do ensino bíblico de que a salvação é inteiramente uma dádiva da graça de Deus, sendo recebida por meio da fé, que também é dom do alto (Ef 2.8-9). Tendo em vista a obra expiatória realizada por Jesus Cristo na cruz, Deus justifica o pecador que crê, isto é, declara-o justo e aceita-o como justo, possuidor não de uma justiça própria, mas da justiça de Cristo. Essa verdade solene e fundamental foi afirmada pelos reformadores em três expressões latinas: “Solo Christo”, “Sola gratia” e “Sola fides”. Justificado pela graça mediante a fé, e não por obras, o pecador redimido é chamado para uma vida de serviço a Deus e ao próximo.
3. O sacerdócio de todos os crentes
A Igreja Medieval era dividida em duas partes: de um lado estava o clero, os religiosos, a hierarquia, a instituição eclesiástica; do outro lado estavam os fiéis, os leigos, os cristãos comuns. Acreditava-se que a salvação destes dependia da ministração daqueles. À luz das Escrituras, os reformadores eliminaram essa distinção. Todos, ministros e fiéis, são o povo de Deus, são sacerdotes do Altíssimo (1 Pedro 2.9-10). Como tais, todos têm livre acesso à presença do Pai, tendo como único mediador o Senhor Jesus Cristo. Além disso, cada cristão tem um ministério a realizar, como sacerdote, servo e instrumento de Deus na Igreja e na sociedade. Que esses princípios basilares, repletos de implicações revolucionárias, continuem sendo cultivados e vividos pelos herdeiros da Reforma.
Autor: Rev. Alderi Souza de Matos 

quinta-feira, 17 de outubro de 2013

A Morte, o Estado Intermediário e a Glorificação

• Qual é o propósito da morte na vida cristã?
• Que acontece ao corpo e à alma quando morremos?
• Quando receberemos o corpo ressurreto?
• Como ele será?

1.         EXPLICAÇÃO E BASE BÍBLICA
A.        Morte: Por que os cristãos morrem?
Nosso estudo da aplicação da redenção deve incluir uma consideração da morte e da questão de como os cristãos devem ver a própria morte e a morte dos outros. Devemos também perguntar sobre o que nos acontece entre o tempo que morremos e o tempo em que Cristo vai retornar para nos dar corpos ressurretos.
1. A morte não é uma punição para os cristãos.
Paulo diz-nos claramente que “agora, já não há condenação para os que estão em Cristo Jesus” (Rm 8.1). Todas as penalidades dos nossos pecados já foram pagas.Assim, muito embora saibamos que os cristãos morrem, não devemos considerara morte dos cristãos uma punição de Deus ou de alguma forma um resultado da penalidade devida a nós por causa dos nossos pecados. É verdade que a penalidade pelo pecado é a morte, mas essa penalidade não mais se aplica a nós — nem em termos de morte física nem em termos de morte espiritual ou separação de Deus. Tudo isso foi pago por Cristo. Portanto, deve haver outra razão que não a punição de nossos pecados para a morte que os cristãos enfrentam.
2. A morte é o resultado final da vida no mundo decaído.
Em sua grande sabedoria, Deus decidiu que não nos aplicaria os benefícios da obra redentora de Cristo de uma só vez. Antes ele escolheu aplicar os benefícios da salvação de modo gradual em nossa existência. Semelhantemente, ele resolveu não remover todo o mal do mundo de imediato, mas esperar até o juízo final e o estabelecimento do novo céu e da nova terra. Em resumo, ainda vivemos em um mundo decaído e nossa experiência de salvação é ainda incompleta.
O último aspecto do mundo decaído a ser removido será a morte. Paulo diz: “Então virá o fim, quando ele entregar o Reino a Deus, o Pai, depois de ter destruído todo domínio, autoridade e poder. Pois é necessário que ele reine até que todos os seus inimigos sejam postos debaixo de seus pés. O último inimigo a ser destruído é a morte” (lCo 15.24-26).
Quando Cristo retornar, então se cumprirá a palavra que está escrita: “A morte foi destruída pela vitória”. “Onde está, á morte, a sua vitória? Onde está, á morte, o seu aguilhão?” (lCo 15.54,55). Mas até aquele tempo a morte vai permanecer uma realidade mesmo na vida dos cristãos.
Embora a morte não nos venha como penalidade pelos nossos pecados individuais (porque isso foi pago por Cristo), ela vem como resultado de vivermos no mundo decaído, onde os efeitos do pecado não foram ainda removidos. Ligados à experiência da morte estão outros resultados da queda que prejudicam nosso corpo físico e assinalam a presença da morte no mundo — tanto os cristãos como os não-cristãos experimentam o envelhecimento, as doenças, os prejuízos, os desastres naturais (como as enchentes, tempestades violentas e terremotos). Embora Deus muitas vezes responda às orações para libertar cristãos (e também não-cristãos) de alguns desses efeitos da queda por certo tempo (indicando assim a natureza do seu Reino que se aproxima), os cristãos acabam experimentando todas essas coisas em alguma medida, e, até que Cristo retorne, todos nós ficaremos velhos e morreremos. O “último inimigo” ainda não foi destruído. E Deus resolveu permitir que experimentássemos a morte antes de ganharmos todos os benefícios da salvação que foi conquistada para nós.
3. Deus usa a experiência da morte para completar nossa santificação.
Durante toda a nossa jornada na vida cristã, sabemos que nunca temos de pagar qualquer penalidade pelo pecado, pois tudo foi pago por Cristo (Rm 8.1). Portanto, quando realmente experimentamos dor e sofrimento nesta vida, não devemos nunca pensar que é porque Deus nos esteja punindo (para o nosso mal) . As vezes o sofrimento é simplesmente resultado da vida o no mundo pecaminoso e decaído e às vezes é porque Deus nos está disciplinando (para o nosso bem), mas em todo o caso Paulo nos assegura: “Sabemos que Deus age em todas as coisas para o bem daqueles que o amam, dos que foram chamados de acordo com o seu propósito” (Rm 8.28).
O propósito positivo de Deus nos disciplinar está claramente afirmado em Hebreus 12 , onde lemos: “pois o Senhor disciplina a quem ama [...] Deus nos disciplina para o nosso bem, para que participemos da sua santidade. Nenhuma disciplina parece ser motivo de alegria no momento, mas sim de tristeza. Mais tarde, porém, produz fruto de justiça e paz para aqueles que por ela foram exercitados”(Hb 12.6,10,11). Nem toda disciplina serve para nos corrigir quando cometemos pecados; Deus pode permiti-la para o nosso fortalecimento, a fim de que possamos ganhar mais capacidade de confiar nele e de resistir ao pecado no desafiador caminho da obediência. Vemos isso claramente na vida de Jesus, que, mesmo sendo sem pecado, todavia “ aprendeu a obedecer por meio daquilo que sofreu” (Hb 5.8). Ele foi aperfeiçoado “mediante o sofrimento” (Hb 2.10). Portanto, devemos ver toda fadiga e sofrimento que nos acontece na vida como algo que Deus nos traz para o nosso bem, para o fortalecimento de nossa confiança nele, para nossa obediência a ele e, em última instância, para aumentar nossa capacidade de glorificá-lo.
O entendimento de que a morte não é de modo algum a punição pelo pecado, mas simplesmente algo que Deus nos faz passar a fim de tornar-nos mais parecidos com Cristo, deve servir de grande encorajamento para nós. Esse entendimento deve retirar de nós todo o temor da morte que assalta a mente dos crentes (cf.Hb 2.15). Todavia, embora Deus venha anos fazer um bem por meio do processo da morte, devemos ainda lembrar que a morte não é natural, não é uma coisa boa e, no mundo criado por Deus, ela é algo que não deveria existir. Ela é uma inimiga — algo que Cristo finalmente vai destruir (1Co 15.26).
4. Nossa obediência a Deus é mais importante que preservar a vida.
Se Deus usa a experiência da morte para aprofundar a confiança nele e para fortalecer nossa obediência a ele, então é importante que nos lembremos de que o alvo de preservar a vida neste mundo a qualquer custo não é o alvo maior para o cristão: a obediência a Deus e a fidelidade a ele em todas as circunstâncias são coisas muito mais importantes. Essa é a razão pela qual Paulo pôde dizer:
“Estou pronto não apenas para ser amarrado, mas também para morrer em Jerusalém pelo nome do Senhor Jesus” (At 21.13; cf. 25.11). Ele disse aos presbíteros de Éfeso: “Todavia, não me importo, nem considero a minha vida de valor algum para mim mesmo, se tão-somente puder terminar a corrida e completar o ministério que o Senhor Jesus me confiou, de testemunhar do evangelho da graça de Deus” (At 20.24). Quando Paulo estava em prisão, não sabendo se morreria ali ou se sairia vivo, ainda pôde dizer: “Aguardo ansiosamente e espero que em nada serei envergonhado. Ao contrário, com toda a determinação de sempre, também agora Cristo serei engrandecido em meu corpo, quer pela vida, quer pela morte” (Fp 1.20).
A persuasão de que podemos honrar ao Senhor mesmo na morte e de que a fidelidade a ele é muito mais importante que preservar nossa vida deu coragem e motivação aos mártires no decorrer de toda a história da igreja. Quando confrontados com a escolha entre preservar a própria vida e pecar ou abrir mão da própria vida e ser fiel, escolhiam abrir mão da própria vida: “diante da morte, não amaram a própria vida” (Ap 12.11). Mesmo em tempos em que há pouca perseguição e pouca coisa semelhante ao martírio, seria bom fixarmos essa verdade em nossa mente de uma vez por todas, pois, se desejarmos abrir mão até mesmo de nossa vida por fidelidade a Deus, veremos que é muito mais fácil abrir mão de qualquer outra coisa por causa de Cristo.
B.        O que devemos pensar sobre nossa morte e a morte dos outros?
1. Nossa própria morte.
O NT nos encoraja a ver a própria morte não com temor, mas com alegria pela perspectiva de partir e estar com Cristo. Paulo diz: “Temos, pois, confiança e preferimos estar ausentes do corpo e habitar com o Senhor” (2Co 5.8). Quando está na prisão, não sabendo se seria executado ou se seria solto, ele pode dizer: “porque para mim o viver é Cristo e o morrer é lucro. Caso continue vivendo no corpo, terei fruto do meu trabalho. E já não sei o que escolher! Estou pressionado dos dois lados: desejo partir e estar com Cristo, o que é muito melhor” (Fp 1.21-23).
Também lemos as palavras de João no Apocalipse: “Então ouvi uma voz dos céus dizendo: ‘Escreva: Felizes os mortos que morrem no Senhor de agora em diante'. Diz o Espírito: ‘Sim, eles descansarão das suas fadigas, pois as suas obras os seguirão” (Ap 14.13).
Os crentes, portanto, não precisam ter medo de morrer, porque a Escritura nos assegura de que nem mesmo a morte “será capaz de nos separar do amor de Deus que está em Cristo Jesus, nosso Senhor” (Rm 8.39; cf. Sl 23.4). De fato, Jesus morreu para libertar “aqueles que durante toda a vida estiveram escravizados pelo medo da morte” (Hb 2.15). Esse versículo nos lembra de que, quando falamos de maneira clara sobre nossa ausência de temor da morte, isso proporciona um forte testemunho para pessoas idosas que tentam evitar falar sobre a morte e que não possuem nenhuma resposta para ela.
2. A morte de parentes e amigos cristãos.
 Embora aguardemos o tempo de nossa própria morte com a expectativa alegre de estar na presença de Cristo, nossa atitude será um tanto diferente quando experimentarmos a morte de amigos crentes e parentes. Nesses casos, experimentaremos a tristeza genuína — mas mesclada com alegria porque eles foram estar com o Senhor.
Não é errado expressar a tristeza real pela perda da comunhão com os nossos amados que morrem e também tristeza pelo sofrimento e angústia que eles possam ter experimentado antes de morrer. Às vezes os cristãos pensam que mostram falta de fé se lamentam profundamente por um irmão na fé que morreu. Mas a Escritura não dá apoio a essa idéia, porque, quando Estêvão foi apedrejado, lemos : “Alguns homens piedosos sepultaram Estêvão e fizeram por ele grande lamentação” (At 8.2). Certamente não houve nenhuma falta de fé por parte de ninguém pelo fato de Estêvão estar no céu experimentando grande alegria na presença do Senhor. Todavia, a tristeza daqueles homens piedosos mostrou o genuíno pesar que sentiram com a perda da comunhão de quem amavam, e não foi errado expressá-la — foi correto! Mesmo Jesus, diante da tumba de Lázaro, “chorou” (Jo 11.35), experimentando tristeza pelo fato de Lázaro ter morrido e por suas irmãs e outras pessoas estarem experimentando tristeza, bem como também, sem dúvida, pelo fato de que havia morte no mundo, pois, em última instância, a morte é antinatural e não deveria estar no mundo criado por Deus.
Não obstante, a tristeza que sentimos pela morte de nossos queridos está claramente misturada com esperança e alegria. Paulo não diz aos tessalonicenses que eles não deveriam de forma alguma sentir aflição por causa dos seus amados que haviam morrido, mas ele escreve:
“Irmãos, não queremos que vocês sejam ignorantes quanto aos que dormem, para que não se entristeçam como os outros que não têm esperança” (lTs 4.13). Eles não deviam se entristecer do mesmo modo, com o mesmo desespero amargo, como acontece com os descrentes. Mas certamente eles se entristeceriam. Ele lhes assegura que Cristo “morreu por nós para que, quer estejamos acordados quer dormindo, vivamos unidos a ele” (lTs 5.10) e, desse modo, ele os encoraja dizendo que os que morrem vão estar com o Senhor. Essa é a razão por que a Escritura pode dizer: “Felizes os mortos que morrem no Senhor [...] eles descansarão das suas fadigas, pois as suas obras os seguirão” (Ap 14.13). De fato, a Escritura mesmo nos diz: “O SENHOR vê com pesar a morte de seus fiéis” (S1 116.15).
Portanto, embora tenhamos genuína tristeza quando amigos e parentes cristãos morrem, podemos dizer com a Escritura: “‘Onde está, á morte, a sua vitória? Onde está, ó morte, o seu aguilhão?' [...] Mas graças a Deus, que nos dá a vitória por meio de nosso Senhor Jesus Cristo (lCo 15.55,57). Ainda que choremos, nosso choro deve ser misturado com adoração a Deus e ações de graças pela vida dos queridos que morreram.
3. A morte dos descrentes.
Quando os descrentes morrem, a dor que sentimos não está misturada com a alegria da segurança de que eles foram estar com o Senhor para sempre. Essa dor, especialmente em relação àqueles com quem estivemos bastante ligados, é muito profunda e real. Paulo, ao pensar a respeito de alguns de seus irmãos judeus que haviam rejeitado Cristo, disse: “Digo a verdade em Cristo, não minto; minha consciência o confirma no Espírito Santo: tenho grande tristeza e constante angústia em meu coração. Pois eu até desejaria ser amaldiçoado e separado de Cristo por amor de meus irmãos, os de minha raça” (Rm 9.1-3).
Deve ser dito ainda que muitas vezes não temos certeza absoluta de que uma pessoa persistiu ate a morte em sua rejeição a Cristo. O conhecimento da morte iminente que uma pessoa tem vai com freqüência produzir uma sondagem genuína do coração por parte da pessoa que está à morte, e às vezes as palavras da Escritura ou palavras de testemunho cristão que foram ouvidas muito tempo atrás serão lembradas, podendo levar ao arrependimento e fé genuínos. Certamente não temos qualquer certeza de que isso aconteceu a menos que haja uma evidência explícita disso, mas também é salutar perceber que em muitos casos temos um conhecimento provável, mas não absoluto de que aqueles a quem conhecemos como descrentes persistiram em sua incredulidade até a morte. Em alguns casos simplesmente não sabemos.
Não obstante, após a morte de um não-cristão certamente seria errado fornecer qualquer indicação a outros de que pensamos que tal pessoa foi para o céu. Isso seria simplesmente fornecer uma informação errônea e uma segurança falsa e diminuiria a urgência da necessidade dos que ainda estão vivos de confiar em Cristo. É muito melhor, em tais ocasiões, à medida que Deus proporciona oportunidade, gastar tempo para refletir sobre nossa vida e nosso destino e ainda partilhar o evangelho com outras. De fato, as ocasiões em que somos capazes de falar como amigos aos amados de um descrente que morreu são muitas vezes as oportunidades que o Senhor abre para falarmos a respeito do evangelho com os que ainda estão vivos.
C.        O que acontece quando as pessoas morrem?
1. A alma dos crentes vai imediatamente para a presença de Deus.
A morte é a cessação temporária da vida corporal e a separação entre a alma e o corpo. Uma vez que o crente morre, embora o seu corpo físico permaneça na terra sepultado, no momento da morte sua alma (ou espírito) vai imediatamente para a presença de Deus com regozijo. Quando Paulo reflete sobre a morte, ele diz: “Temos, pois, confiança e preferimos estar ausentes do corpo e habitar com o Senhor” (2Co 5.8). Estar ausente do corpo é estar em casa com o Senhor. Ele também diz que o seu desejo é “partir e estar com Cristo, o que é muito melhor” (Fp 1.23). Jesus disse ao ladrão que estava à sua direita: “Hoje você estará comigo no paraíso” (Lc 2 3.43). O autor de Hebreus diz que, quando os cristãos comparecem para adorar juntos, eles vêm não somente à presença de Deus no céu, mas também à presença dos “espíritos dos justos aperfeiçoados” (Hb 12.23). Contudo, como veremos em mais detalhes a seguir, Deus não vai deixar o corpo para sempre na sepultura, pois, quando Cristo retornar, a alma dos crentes será reunida ao corpo, o corpo será ressuscitado dentre os mortos e os crentes viverão com Cristo eternamente.
a. A Bíblia não ensina a doutrina do purgatório.
O fato de que a alma dos crentes vai imediatamente para a presença de Deus significa que não há nada semelhante a purgatório.
No ensino da Igreja Católica Romana, o purgatório é o lugar para onde a alma dos crentes vai a fim de ser purificada do pecado, até que esteja pronta para ser admitida no céu. De acordo com esse pensamento os sofrimentos do purgatório são dados por Deus em substituição à punição dos pecados que os crentes deveriam ter recebido nesta vida, mas não receberam.
Mas essa doutrina não é ensinada na Escritura, e é de fato contrária aos versículos citados anteriormente.A Igreja Católica Romana retirou o apoio para essa doutrina não das páginas das Escrituras canônicas que os protestantes aceitaram desde a Reforma, mas nos escritos apócrifos. Antes de tudo, deve ser dito que essa literatura não é igual à Escritura em autoridade e não deve ser tomada como fonte de doutrina cheia de autoridade. Além disso, os textos dos quais essa doutrina é derivada contradizem afirmações claras do NT e, assim, se opõem ao ensino da Escritura. Por exemplo, o texto primário usado nesse sentido , 2Macabeus 12.42-45, contradiz as afirmações claras da Escritura citadas anteriormente a respeito de partir para estar com Cristo. O texto diz o seguinte: [Depois, tendo organizado uma coleta individual, Judas Macabeus, o líder das forças judaicas] enviou a Jerusalém cerca de duas mil dracmas de prata, a fim de que se oferecesse um sacrifício pelo pecado: agiu assim absolutamente bem e nobremente, com o pensamento na ressurreição. De fato, se ele não esperasse que os que haviam sucumbido iriam ressuscitar, seria supérfluo e tolo rezar pelos mortos. Mas, se considerava que uma belíssima recompensa está reservada para os que adormecem na piedade, então era santo e piedoso o seu modo de pensar. Eis por que ele mandou oferecer esse sacrifício expiatório pelos que haviam morrido, afim de que fossem absolvidos do seu pecado.
Aqui fica claro que tanto a oração pelos mortos como fazer uma oferta a Deus para libertar os mortos de seus pecados são práticas aprovadas. Mas isso contradiz o ensino explícito do NT de que somente Cristo fez expiação por nós. Essa passagem em 2Macabeus é difícil de enquadrar mesmo com o ensino católico romano, porque ele ensina que orações e sacrifícios deviam ser oferecidos pelos soldados que haviam morrido no pecado mortal da idolatria (que não pode ser perdoado, segundo o ensino de Roma) para possibilitar que eles viessem a ser libertos de seu sofrimento.
Outras passagens às vezes usadas para dar suporte à doutrina do purgatório são Mateus 12.32 e 1 Coríntios 3.15. Em Mateus 12.32, Jesus diz: “Todo aquele que disser uma palavra contra o Filho do homem será perdoado, mas quem falar contra o Espírito Santo não será perdoado, nem nesta era nem na que há de vir”. Ludwig Ott comenta que essa frase “deixa aberta a possibilidade de que pecados são perdoados não somente neste mundo, mas no mundo por vir” . Contudo, isso simplesmente é um erro de raciocínio, pois dizer que alguma coisa não acontecerá na era por vir não implica que possa acontecer na era por vir! O que é necessário para provar a doutrina do purgatório não é uma afirmação negativa como essa, mas uma afirmação positiva que diga que pessoas sofrem com o propósito de ser continuamente aperfeiçoadas até morrerem. Mas a Escritura não diz isso em lugar algum.
Em 1 Coríntios 3.15 Paulo diz que, no diz do julgamento, a obra que uma pessoa fez será julgada e testada pelo fogo, e então conclui: “Se o que alguém construiu se queimar, esse sofrerá prejuízo; contudo, será salvo como alguém que escapa através do fogo”. Mas isso não é o mesmo que falar de uma pessoa sendo queimada ou sofrendo punição, mas simplesmente de sua obra sendo testada pelo fogo — o que é bom será igual ao ouro, prata e pedras preciosas, que vão durar para sempre (v. 12). Além disso, o próprio Ott admite que esse fato ocorre não durante esta era, mas durante o dia do “julgamento geral” , o que indica que dificilmente esse texto pode ser usado como argumento convincente para o purgatório.
Um problema ainda mais sério com essa doutrina é que ela ensina que devemos acrescentar alguma coisa à obra redentora de Cristo e que a sua obra redentora por nós não foi suficiente para pagar a penalidade de todos os nossos pecados. Mas isso é certamente contrário ao ensino da Escritura. Além disso, em sentido pastoral, a doutrina do purgatório rouba dos crentes o grande conforto que lhes deveria pertencer por saber que os que morreram foram imediatamente para a presença do Senhor e por saber que eles também, quando morrerem, partirão e estarão “com Cristo, o que é muito melhor” (Fp 1.23).
b. A Bíblia não ensina a doutrina do “sono da alma”.
O fato de que a alma dos crentes vai imediatamente para a presença de Deus também significa que a doutrina do sono da alma é incorreta. Essa doutrina ensina que, quando morrem, os crentes entram no estado de existência inconsciente, e a próxima coisa de que terão consciência será quando Cristo retornar e os ressuscitar para a vida eterna. Essa doutrina nunca encontrou grande aceitação na igreja.
O suporte para esse pensamento tem sido geralmente encontrado no fato de que a Escritura diversas vezes fala do estado dos mortos como de um sono ou de “adormecer” (Mt 9.24; 27.52; Jo 11.11; At 7.60; 13.36; lCo 15.6,18,20,51; lTs 4.13; 5. l0). Além disso, certas passagens parecem ensinar que os mortos não possuem existência consciente (v. Sl 6.5; 115.17 [mas repare no v. 18!] ; Ec 9.10; Is 38.19) . Porém, quando a Escritura apresenta a morte como sono, trata-se simplesmente de uma expressão metafórica usada para indicar que a morte é somente temporária para os cristãos, exatamente como o sono é temporário. Isso é claramente visto, por exemplo, quando Jesus fala com seus discípulos a respeito da morte de Lázaro. Ele diz: “Nosso amigo Lázaro adormeceu, mas vou até lá para acordá-lo” (Jo 11.11). Então João explica: “Jesus tinha falado de sua [de Lázaro] morte, mas os seus discípulos pensaram que ele estava falando simplesmente do sono. Então lhes disse claramente: ‘Lázaro morreu”'(Jo 11.13,14). As outras passagens que falam a respeito de pessoas dormindo quando morrem devem ser também interpretadas como simplesmente uma expressão metafórica para ensinar que a morte é temporária.
Com respeito às passagens que indicam que os mortos não louvam a Deus ou que há uma cessação de atividade consciente quando as pessoas morrem, devem ser todas entendidas da perspectiva da vida neste mundo. De nossa perspectiva, parece que, uma vez que as pessoas morrem, elas não se dedicam nunca mais a essas atividades... Mas o salmo 115 apresenta uma perspectiva plenamente bíblica desse ponto de vista. Ele diz: “Os mortos não louvam o SENHOR, tampouco nenhum dos que descem ao silêncio”(v. 17). Todavia, ele prossegue no próximo versículo com um contraste, demonstrando que os que crêem em Deus bendirão o Senhor para sempre: “ Mas nós bendiremos O SENHOR, desde agora e para sempre! Aleluia!” (v. 18).
Em última análise, as passagens citadas demonstrando que a alma dos crentes vai imediatamente para a presença de Deus e desfruta comunhão com ele ali (2Co 5.8; Fp 1.23; Lc 23.43; Hb 12.23) indicam, todas elas, que há para o crente existência consciente e comunhão com Deus imediatamente após a morte. Jesus não disse: “Hoje você não terá mais consciência de qualquer coisa que está por acontecer”, e sim: “Hoje você estará comigo no paraíso” (Lc 23.43). Certamente a concepção de paraíso entendida naquela época não era a de existência inconsciente, mas de grande bênção e alegria na presença de Deus. Paulo não diz: “Desejo partir e ficar inconsciente por um longo período de tempo”, mas antes “desejo partir e estar com Cristo” (Fp 1.23). Ele certamente sabia que Cristo não estava inconsciente, o Salvador adormecido, mas o Salvador que estava vivo e reinando no céu. Estar com Cristo significava desfrutar a bênção da comunhão da sua presença, e essa é a razão por que partir e estar com Cristo era “muito melhor” (Fp 1.23). Assim, ele diz: “Temos, pois, confiança e preferimos estar ausentes do corpo e habitar com o Senhor” (2Co 5.8).
c. Devemos orar pelos mortos?
Finalmente, o fato de que a alma dos crentes vai imediatamente para a presença de Deus significa que nós não devemos orar pelos mortos. Embora a oração pelos mortos seja ensinada em 2Macabeus 12.42-45 (v. anteriormente), em lugar algum da Escritura isso é ensinado.Além disso, não há indicação alguma de que essa tenha sido a prática dos cristãos no tempo do NT, nem deveria ter sido. Uma vez que os crentes morrem, entram na presença de Deus e ficam no estado de alegria perfeita com ele. Que bom não ter de orar por eles nunca mais! A recompensa celeste final será baseada em atos praticados nesta vida, como a Escritura repetidamente testifica (1 Co 3.12-15; 2Co 5.10; ect.) . Ademais, a alma dos descrentes que morrem vai para o lugar de punição e de eterna separação da presença de Deus. Não seria bom orar por eles também, visto que o destino final deles é estabelecido por seus pecados e por sua rebelião [Em outros dois usos do NT, a palavra paraíso significa ”céu”. Em 2Coríntios 12.4 é o lugar ao qual Paulo foi arrebatado em sua revelação do céu, e em Apocalipse 2.7 é o lugar onde encontramos a árvore da vida.] contra Deus nesta vida. Orar pelos mortos, portanto, é simplesmente orar por algo que Deus nos disse que já foi decidido. Além disso, ensinar que devemos orar pelos mortos ou incentivar outros a fazer isso seria encorajar a falsa esperança de que o destino das pessoas pode ser mudado após a morte delas, algo que a Escritura não nos orienta a fazer em lugar algum.
2. A alma dos descrentes vai imediatamente para a punição eterna.
A Escritura nunca nos encoraja a pensar que as pessoas terão outra oportunidade de confiar em Cristo após a morte. De fato, trata-se exatamente do contrário. A parábola de Jesus a respeito do rico e de Lázaro não dá esperança alguma de que as pessoas possam passar do inferno para o céu após terem morrido. Embora o rico no inferno tivesse gritado : “Pai Abraão, tem misericórdia de mim e manda que Lázaro molhe a ponta do dedo na água e refresque a minha língua, porque estou sofrendo muito neste fogo”, Abraão lhe respondeu: “entre vocês e nós há um grande abismo, de forma que os que desejam passar do nosso lado para o seu, ou do seu lado para o nosso, não conseguem”(Lc 16.24-26).
O livro de Hebreus associa a morte com a conseqüência do julgamento em uma seqüência imediata: “Da mesma forma, como o homem está destinado a morrer uma só vez e depois disso enfrentar o juízo” (Hb 9.27). Além disso, a Escritura nunca apresenta o juízo final como dependente de qualquer coisa feita após a nossa morte, mas dependendo somente do que aconteceu nesta vida (Mt 25.31-46; Rm 2.5-10; cf. 2Co 5. 10) . Alguns argumentam a favor de outra oportunidade para se crer no evangelho com base na pregação de Cristo aos espíritos em prisão em 1 Pedro 3.18-20 e na pregação do evangelho “a mortos” em 1 Pedro 4.6 , mas essas são interpretações inadequadas dos versículos em questão e, numa análise mais precisa, não dão apoio a tal pensamento.
Devemos também perceber que a idéia de que haverá outra oportunidade de aceitar Cristo após a morte é baseada na suposição de que cada pessoa merece uma oportunidade para aceitar Cristo e que a punição eterna vem aos que conscientemente decidem rejeitá-lo. Mas certamente essa idéia não tem o apoio da Escritura; todos nós somos pecadores por natureza e escolha, e realmente ninguém merece nenhuma graça de Deus nem nenhuma oportunidade de ouvir o evangelho de Cristo — que vêm ao homem somente por causa do favor imerecido de Deus. A condenação vem não somente por causa da rejeição deliberada de Cristo, mas também por causa dos pecados que todos cometemos e da rebelião contra Deus que esses pecados representam (v. Jo 3.18)
Embora os descrentes passem para o estado de punição eterna imediatamente após a morte, o corpo deles não será ressuscitado até o dia do juízo. Naquele dia, o corpo de cada um será ressuscitado e reunido à alma, e comparecerão perante o trono de Deus para o juízo final que vai ser pronunciado sobre eles, incluindo o corpo (v. Mt 25.31-46; Jo 5.28,29; At 24.15; Ap 20.12,1 5) . Isso nos conduz à consideração da ressurreição do corpo do crente, que é o passo final de sua redenção.
D. Glorificação
Como foi mencionado anteriormente, Deus não deixará nosso corpo morto na sepultura para sempre. Quando Cristo nos redimiu, ele não redimiu apenas nosso espírito (ou alma) — ele nos redimiu como pessoas completas, e isso inclui a redenção de nosso corpo. Portanto, a aplicação da obra redentora de Cristo a nós não será completa até que nosso corpo seja inteiramente liberto dos efeitos da queda e trazido ao estado de perfeição para o qual Deus o criou. De fato, a redenção de nosso corpo ocorrerá somente quando Cristo retornar e ressuscitá-lo dentre os mortos. Mas, no tempo presente, Paulo diz que esperamos pela “redenção do nosso corpo” e então acrescenta: “Pois nessa esperança fomos salvos” (Rm 8.23,24). O estágio da aplicação da redenção em que receberemos por fim o corpo ressuscitado é chamado de glorificação. Referindo-se àquele dia futuro, Paulo diz que participaremos da glória de Cristo (cf. Rm 8.17) . Além disso, quando Paulo traça os passos na aplicação da redenção, o último que menciona é a glorificação: “E aos que predestinou, também chamou; aos que chamou, também justificou; aos que justificou, também glorificou” (Rm 8.30).
Podemos definir glorificação da seguinte maneira: A glorificação é o passo final na aplicação da redenção. Ela acontecerá quando Cristo retornar e ressuscitar dentre os mortos os corpos de todos os crentes de todas as épocas que morreram e reuni-los às respectivas almas, e mudar os corpos de todos os crentes que permanecerem vivos, dando assim a todos os crentes ao mesmo tempo um corpo ressuscitado perfeito igual ao seu.
1. Razão bíblica apresentada para a glorificação.
A passagem mais importante do NT para a glorificação ou ressurreição do corpo é lCoríntios 15.12-58. Paulo diz : [...] em Cristo todos serão vivificados . Mas cada um por sua vez: Cristo, o primeiro; depois, quando ele vier, os que lhe pertencem (v. 22,23). Paulo discute a natureza da ressurreição do corpo em alguns detalhes nos versículos 35-50 , e a seguir conclui a passagem dizendo que nem todos os cristãos morrerão, mas alguns que permanecerem vivos quando Cristo retornar simplesmente terão seu corpo instantaneamente transformado em um novo corpo ressurreto, que nunca irá envelhecer, enfraquecer ou morrer: “Eis que eu lhes digo um mistério: Nem todos dormiremos, mas todos seremos transformados, num momento, num abrir e fechar de olhos, ao som da última trombeta. Pois a trombeta soará, os mortos ressuscitarão incorruptíveis e nós seremos transformados” (lCo 15.51,52).
Posteriormente Paulo explica em lTessalonicenses que a alma dos que morreram e foram estar com Cristo voltará e se unirá ao corpo naquele dia, pois Cristo a trará consigo :”Se cremos que Jesus morreu e ressurgiu, cremos também que Deus trará, mediante Jesus e com ele, aqueles que nele dormiram” (lTs 4.14). Mas aqui Paulo não somente afirma que Deus trará mediante Jesus os que morreram; ele também afirma que “ os mortos em Cristo ressuscitarão primeiro” (lTs 4.16). Assim, esses crentes que morreram com Cristo também ressuscitarão para se encontrar com ele (Paulo diz no v. 17 que “nós, os que estivermos vivos seremos arrebatados com eles nas nuvens, para o encontro com o Senhor nos ares”). Isso somente faz sentido se diz respeito à alma dos crentes que partiram para a presença de Cristo e que retornam com ele, e se é o corpo deles que é ressuscitado dentre os mortos para ser reunido à sua alma e, então, ascender para estar com ele.
2. Com que se assemelhará o corpo ressurreto?
Se Cristo vai ressuscitar o nosso corpo dentre os mortos quando retornar e se nosso corpo será igual ao seu corpo ressurreto (1 Co 15.20,23,49; Fp 3.21), então a que se assemelhará nosso corpo?
Usando o exemplo de lançar a semente no solo e então aguardá-la crescer e se tornar algo muito mais maravilhoso, Paulo passa a explicar em detalhes com o que nosso corpo será parecido: “Assim será a ressurreição dos mortos. O corpo que é semeado é perecível e ressuscita imperecível; é semeado em desonra e ressuscita em glória; é semeado em fraqueza e ressuscita em poder; é semeado um corpo natural e ressuscita um corpo espiritual. [...] Assim como tivemos a imagem do homem terreno, teremos também a imagem do homem celestial” (lCo 15.42-44,49).
Paulo primeiro afirma que nosso corpo ressuscitado será “imperecível”. Isso significa que ele não se desgastará nem envelhecerá, nem mesmo estará sujeito a qualquer espécie de doença ou enfermidade. Ele será completamente sadio e forte para sempre.Além disso, já que o processo gradual de envelhecimento é parte do processo pelo qual nosso corpo está agora sujeito à pericibilidade, é apropriado pensar que nosso corpo ressuscitado não apresentará qualquer sinal de envelhecimento, antes terá as características da juventude mas ao mesmo tempo de masculinidade ou feminilidade madura para sempre. Não haverá qualquer evidência de doença ou dano, pois todos se tornarão perfeitos. Nosso corpo ressuscitado evidenciará o cumprimento da sabedoria perfeita de Deus em nos criar como seres humanos que são a coroa da sua criação e os portadores apropriados de sua imagem e semelhança. No corpo ressuscitado claramente veremos a humanidade como Deus pretendeu que fosse.
Paulo também diz que nosso corpo será ressuscitado “em glória”. Quando esse termo é contrastado com “desonra”, como é aqui, há uma insinuação da beleza ou da atração que nosso corpo exercerá. Ele não mais será ”desonrável” ou desprovido de atração, mas parecerá “glorioso” em sua beleza. Ele pode até possuir um fulgor radiante em si mesmo (v. Dn 12.3; Mt 13.43).
Nosso corpo também será ressuscitado “em poder” (lCo 15.43). Isso contrasta com a “fraqueza” que vemos em nosso corpo agora. Nosso corpo ressurreto não será somente livre das doenças e do envelhecimento, também receberá plenitude de força e poder — não um poder infinito como o de Deus, naturalmente, e provavelmente nada que se assemelhe a um poder “super-humano” no sentido dos super-heróis da moderna literatura de ficção para crianças, por exemplo; mas ele terá mesmo assim a força e o poder humanos de maneira completa e plena, a força que Deus pretendeu que os seres humanos tivessem em seu corpo quando originariamente os criou. Portanto, ele terá força suficiente para fazer tudo o que desejarmos e que estiver de conformidade com a vontade de Deus.
Por último, Paulo diz que o corpo ressuscitado é um “corpo espiritual” (lCo 15.44). Nas cartas paulinas, a palavra “espiritual” (gr., pneumatikos) nunca significa “não-físico”, e sim “consistente com o caráter e a atividade do Espírito Santo” (v.,p.ex.,Rm 1.11; 7.14; lCo 2.13,15; 3.1; 14.37; Gl 6.1 [“vocês, que são espirituais”]; Ef 5.19). Por isso, a expressão “corpo material” (encontrada em algumas traduções) é inadequada, pois em contraste com “corpo espiritual”. 0 fato de o sinal dos cravos permanece nas mãos de Jesus é um caso especial para nos fazer lembrar do preço que foi pago por nossa redenção, não deve ser entendido que quaisquer marcas ou lesões permanecerão em nós, daria a entender que “corpo espiritual” é um corpo não-físico, imaterial. Em vez de “corpo material”, a tradução melhor seria “corpo natural”. A seguinte paráfrase é esclarecedora: “É semeado um corpo natural [isto é, sujeito às características e aos desejos desta era, dominado por sua vontade pecaminosa] e ressuscita um corpo espiritual [isto é, integralmente sujeito à vontade do Espírito Santo e suscetível à orientação dele] ”. Não se trata de um corpo “não-físico”, mas de um corpo físico ressuscitado e elevado ao grau de perfeição que originariamente Deus pretendeu que tivéssemos. Os exemplos repetidos em que Jesus demonstrou aos discípulos que ele tinha um corpo físico que era capaz de ser tocado, que possuía carne e OSSOS (Lc 24.39) e que poderia comer mostram que o corpo de Jesus, que é modelo para o nosso, era claramente um corpo físico que havia se tornado perfeito.
Para concluir, quando Cristo retornar, ele nos dará novos corpos para que sejam iguais ao seu corpo ressurreto: “... sabemos que, quando ele se manifestar, seremos semelhantes a ele, pois o veremos como ele é” (lJo 3.2; essa afirmação é verdadeira não somente no sentido ético, mas também em termos de nosso corpo físico; cf. 1 Co 15.49; tb. Rm 8.29). Tal segurança proporciona a afirmação clara de que a criação física de Deus é boa. Viveremos nos corpos que terão todas as qualidades excelentes que Deus criou para que as tivéssemos e, assim, para sempre seremos prova viva da sabedoria de Deus em fazer tudo na criação material, desde o princípio, “muito bom” (Gn 1.31). Viveremos como crentes ressuscitados no novo corpo,e ele será adequado para a nossa habitação nos “novos céus e nova terra, onde habita a justiça” (2Pe 3.13).
Autor: Wayne Grudem

O Estado Intermediário

“Ela não está morta, mas dorme” (Lucas 8:52). Jesus fez este comentário sobre a filha de Jairo, quando estava prestes a ressuscitá-la dos mortos. Freqüentemente a Bíblia refere-se à morte usando a figura do “sono”. Por causa dessa imagem, alguns têm concluído que o Novo Testamento ensina a doutrina do sono da alma.
O sono da alma é geralmente descrito como um tipo de animação suspensa temporária da alma, entre o momento da morte pessoal e o tempo quando nosso corpo será ressuscitado. Quando nosso corpo ressuscitar dos mortos, a alma será despertada para iniciar uma continuidade pessoal e consciente no céu. Embora séculos possam se passar entre a morte e a ressurreição final, a alma “adormecida” não terá consciência da passagem do tempo. Nossa transição da morte para o céu parecerá ser instantânea.
O sono da alma representa um afastamento do cristianismo ortodoxo. Ele permanece, entretanto, como uma minoria firmemente entrincheirada no meio cristão. A visão tradicional é chamada de estado intermediário. Este ponto de vista crê que na morte a alma do crente vai imediatamente estar com Cristo e experimentará uma existência pessoal contínua e consciente enquanto aguarda a ressurreição final do corpo. Quando o credo apostólico fala da “ressurreição do corpo”, não está se referindo à ressurreição do corpo humano de Cristo (o qual também é afirmado no Credo), mas à ressurreição de nosso corpo no último dia.
O que acontece, porém, no intervalo? O conceito clássico é que na morte as almas dos crentes são imediatamente glorificados. São aperfeiçoadas em santidade e entram imediatamente na glória. O corpo físico, contudo, permanece na sepultura, aguardando a ressurreição final.
Jesus prometeu ao ladrão na cruz: “Hoje estarás comigo no paraíso” (Lucas 23:43). Aqueles que apóiam o conceito do sono da alma argumentam que Jesus não poderia dizer que encontraria o ladrão no paraíso naquele mesmo dia porque ficaria morto por três dias e ainda não havia subido ao céu. Embora a ascensão de Cristo realmente não houvesse ainda ocorrido e seu corpo certamente estivesse no túmulo, ele havia entregue seu espírito ao Pai. Temos certeza de que no momento de sua morte, a alma de Jesus foi para o Paraíso, conforme havia declarado. Os defensores do sono da alma argumentam que a maioria das versões bíblicas tem se equivocado na posição da vírgula. Eles têm a seguinte redação: “Em verdade te digo hoje, estarás comigo no paraíso”.
Com esta mudança na pontuação, o “hoje” então passa a referir-se ao tempo em que Jesus está falando, e não ao tempo em que ele encontraria o ladrão no paraíso. Esta pontuação, contudo, é improvável. Era perfeitamente óbvio ao ladrão em que dia Jesus estava falando com ele. Dificilmente era necessário que Jesus dissesse que estava falando “hoje”. Este desperdício de palavras, por parte de um homem que lutava para poder respirar nas agonias da crucificação é exatamente improvável. Pelo contrário, de maneira consistente com o resto das evidências bíblicas quanto ao estado intermediário (veja especialmente Filipenses 1:19-26; 2 Coríntios 5:1-10), a promessa para o ladrão é que ele estaria reunido com Cristo no Paraíso naquele mesmo dia.
O estado do crente depois da morte é diferente e melhor do que o experimentado nesta vida, embora não seja tão diferente ou tão abençoado quanto será na ressurreição final. No estado intermediário iremos experimentar a continuação da existência pessoal e consciente na presença de Cristo.
A provação da humanidade termina com a morte. Nosso destino final é determinado quando morremos. Não há esperanças para uma segunda chance de arrependimento depois da morte, e não existe nenhum lugar tal como purgatório para melhorar nossa condição futura. Para o crente, a morte é a emancipação imediata dos conflitos e problemas desta vida, quando então entramos em nosso estado de bem-aventurança.
Apesar de a morte trazer descanso para a alma e a Bíblia freqüentemente referir-se a ela usando o eufemismo do “sono”, não é correto supor que no estado intermediário a alma dorme ou que permanecemos inconscientemente ou num estado de animação suspensa até a ressurreição final.
Sumário

1. O sono da alma afirma que há um período de inconsciente “animação suspensa” da alma entre a morte e a ressurreição final. É um afastamento do cristianismo ortodoxo.
2. O estado intermediário refere-se à nossa presença consciente com Cristo no céu, como almas sem corpo, entre a morte e a ressurreição de nossos corpos.
3. O estado intermediário é melhor do que nosso estado presente, mas não tão maravilhoso como nosso estado final.
4. Não há uma segunda chance de arrependimento depois da morte.

quarta-feira, 16 de outubro de 2013

O Estado da Alma Depois da Morte, Um Estado de Existência Consciente

O Ensino da Escrituras sobre este ponto.
Tem-se levantado a questão sobre se, após a morte, a alma continua ativamente consciente e é capaz de ação racional e religiosa. Por vezes isso tem sido negado, sobre a base geral de que a alma, em sua atividade consciente, depende do cérebro e, portanto, não pode continuar a funcionar quando o cérebro é destruído. Mas, como já foi assinalado anteriormente (Capitulo III.D [da Teologia Sistemática deste autor]), a validade desse argumento pode ser posta em dúvida. "Ele se baseia", para usar as palavras de Dahle, "no erro de confundir o operário com a sua máquina". Do fato de que a consciência humana, na presente vida, transmite os seu efeitos pelo cérebro, não se segue necessariamente que não possa agir de nenhum outro modo.
Ao argumentarmos a favor da existência consciente da alma depois da morte, não nos apoiamos nos fenômenos do espiritismo dos dias atuais, e nem mesmo dependemos de argumentos filosóficos, embora estes não sejam destituídos de força. Buscamos nossas provas na Palavra de Deus, e particularmente no Novo Testamento. O rico e Lázaro participam de uma conversação, Lc 16.19-31. Paulo descreve os estado desencarnado como "habitar com o Senhor", e como uma coisa preferível à vida presente, 2 Co 5.6-9; Fp 1.23. Decerto que dificilmente ele falaria dessa maneira acerca de uma existência inconsciente, que seria uma virtual não existência. 
Em Hb 12.23 se diz que os crentes têm chegado "aos espíritos dos justos aperfeiçoados", o que certamente implica sua existência consciente. Além disso, os espíritos debaixo do altar clamam por vingança contra os perseguidores da Igreja, Ap 6.9, e se afirma que as almas dos mártires reinam com Cristo, Ap 20.4. Esta verdade da existência consciente da alma depois da morte tem sido negada em mais de uma forma.
Autor: Louis Berkhof

O juízo final e a punição eterna

• Quem será julgado?
• Que é inferno?
1. EXPLANAÇÃO E BASE BÍBLICA
A. A realidade do juízo final
A Escritura muitas vezes afirma o fato de que haverá um grande juízo final de crentes e descrentes. Eles comparecerão perante o julgamento de Cristo com seus corpos ressuscitados e ouvirão a proclamação que ele fará do destino eterno deles.
O juízo final é vividamente apresentado na visão de João no Apocalipse:
Depois vi um grande trono branco e aquele que nele estava assentado. A terra e o céu fugiram da sua presença, e não se encontrou lugar para eles.Vi também os mortos, grandes e pequenos, em pé diante do trono, e livros foram abertos. Outro livro foi aberto, o livro da vida. Os mortos foram julgados de acordo com o que tinham feito, segundo o que estava registrado nos livros. O mar entregou os mortos que nele havia, e a morte e o Hades entregaram os mortos que neles havia; e cada um foi julgado de acordo com o que tinha feito. Então a morte e o Hades foram lançados no lago de fogo. O lago de fogo é a segunda morte. Aqueles cujos nomes não foram encontrados no livro da vida foram lançados no lago de fogo (Ap 20.11-15).
Muitas outras passagens ensinam sobre o juízo final. Paulo diz aos filósofos gregos em Atenas: Deus [...] agora ordena que todos, em todo lugar, se arrependam. Pois estabeleceu um dia em que ha de julgar o mundo com justiça, por meio do homem que designou. E deu provas disso a todos, ressuscitando-o dentre os mortos” (At 17.30,31). Semelhantemente, Paulo fala a respeito do “dia da ira de Deus, quando se revelará o seu justo julgamento”(Rm 2.5). Outras passagens falam claramente de um dia de juízo que virá (v. Mt 10.15; 11.22,24; 12.36; 25.31-46; lCo 4.5; Hb 6.2; 2Pe 2.4; Jd 6 etc.).
Esse juízo final é o auge de muitos juízos precursores nos quais Deus recompensou a retidão e puniu a injustiça por toda a história. Ao mesmo tempo em que trouxe bênção e libertação do perigo para os que lhe foram fiéis, incluindo Abel, Noé, Abraão, Isaque, Jacó, Moisés, Davi e os fiéis dentre o povo de Israel, ele também vez por outra trouxe juízo sobre os que persistiram na desobediência e na incredulidade; seus juízos incluíram o Dilúvio, a dispersão do povo na Torre de Babel, os juízos sobre Sodoma e Gomorra e os contínuos julgamentos ao longo de toda a história, tanto sobre indivíduos (Rm 1.18-32) quanto sobre nações (Is 13— 23) que persistiram no pecado. Além disso, na esfera espiritual invisível, ele trouxe juízo sobre os anjos que pecaram (2Pe 2.4). Pedro nos recorda que os juízos de Deus têm sido cumpridos periodicamente e de forma positiva, e isso nos lembra que um juízo final ainda está por vir, pois “o Senhor sabe livrar os piedosos da provação e manter em castigo os ímpios para o dia do juízo, especialmente os que seguem os desejos impuros da carne e desprezam a autoridade” (2Pe 2.9,10).
B. O tempo do juízo final
O juízo final ocorrerá após o milênio e a rebelião que vai ocorrer no final dele. João apresenta o reino milenar e a remoção de Satanás para não influenciar a terra em (Apocalipse 20.1-6) e, então, diz: ‘Quando terminarem os mil anos, Satanás será solto da sua prisão e sairá para enganar as nações que estão nos quatro cantos da terra [...] a fim de reuni-las para a batalha” (Ap 20.7,8). Após Deus derrotar decisivamente essa rebelião final (Ap 20.9,10), João nos diz que o juízo se seguirá: ‘Depois vi um grande trono branco e aquele que nele estava assentado” (v. 11).
C. A natureza do juízo final
1. Jesus Cristo será o juiz.
Paulo fala de “Cristo Jesus, que há de julgar os vivos e os mortos” (2Tm 4.1). Pedro diz que Jesus Cristo é aquele “que Deus constituiu juiz de vivos e de mortos” (At 10.42; cf. 17.3 1; Mt 25.31-33). Esse direito de agir como juiz sobre todo o universo é algo que o Pai deu ao Filho: “o Pai [...J deu-lhe autoridade para julgar, porque é o Filho do homem” (Jo 5.26,27).
2. Os descrentes serão julgados.
Está claro que todos os descrentes comparecerão perante o tribunal de Cristo para julgamento, pois esse julgamento inclui “os mortos, grandes e pequenos (Ap 20.12), e Paulo fala do “dia da ira de Deus, quando se revelará o seu justo julgamento” e que “Deus ‘retribuirá a cada um conforme o seu procedimento’. [...] haverá ira e indignação para os que são egoístas, que rejeitam a verdade e seguem a injustiça” (Rm 2.5,6,8).
Esse juízo dos descrentes incluirá graus de punição, pois lemos que os mortos “foram julgados de acordo com o que tinham feito” (Ap 20.12,13); esse julgamento de acordo com o que as pessoas tiverem feito, portanto, deve envolver a avaliação das obras que as pessoas fizeram. Semelhantemente, Jesus diz: “Aquele servo que conhece a vontade de seu senhor e não prepara o que ele deseja, nem o realiza, receberá muitos açoites. Mas aquele que não a conhece e pratica coisas merecedoras de castigo, receberá poucos açoites. A quem muito foi dado, muito será exigido; e a quem muito foi confiado, muito mais será pedido” (Lc 12.47,48). Quando Jesus diz às [‘O fato de que haverá graus de punição para os descrentes de acordo com suas obras não significa que os descrentes venham a fazer coisas boas para merecer a aprovação de Deus ou ganhar a salvação, pois a salvação vem somente como dom gratuito para os que confiam em Cristo: ”Quem nele crê não é condenado, mas quem não crê já está condenado, por não crer no nome do Filho Unigênito de Deus” (Jo 3.18). Para a discussão do fato de que não haverá “outra oportunidade” para as pessoas aceitarem Cristo após a morte] cidades de Corazim e Betsaida: “Mas eu lhes afirmo que no dia do juízo haverá menor rigor para Tiro e Sidom do que para vocês” (Mt 11.22; cf. v. 24), ou quando diz que os escribas “serão punidos com maior rigor” (Lc 20.47), sugere que haverá graus de punição no último dia.
De fato, cada ação errônea será lembrada e levada em conta na punição que se dará naquele dia, porque “ no dia do juízo, os homens haverão de dar conta de toda palavra inútil que tiverem falado” (Mt 12.36). Cada palavra dita, cada ato cometido serão trazidos à luz e receberão julgamento: “Pois Deus trata a julgamento tudo o que foi feito, inclusive tudo o que está escondido, seja bom, seja mau” (Ec 12.14).
Como esses versículos indicam, no dia do juízo os segredos do coração das pessoas serão revelados e tornados públicos. Paulo fala do dia “em que Deus julgar os segredos dos homens, mediante Jesus Cristo, conforme o declara o meu evangelho” (Rm 2.16; cf. Lc 8.17). “Não há nada escondido que não venha a ser descoberto, ou oculto que não venha a ser conhecido. O que vocês disseram nas trevas será ouvido à luz do dia, e o que vocês sussurraram aos ouvidos dentro de casa, será proclamado dos telhados” (Lc 12.2,3).
3. Os crentes serão julgados.
Escrevendo a cristãos, Paulo diz: “Pois todos compareceremos diante do tribunal de Deus. [...] Assim, cada um de nós prestará contas de si mesmo a Deus” (Rm 14.10,12). Ele também diz aos coríntios: “Pois todos nós devemos comparecer perante o tribunal de Cristo, para que cada um receba de acordo com as obras praticadas por meio do corpo, quer sejam boas quer sejam más” (2Co 5.10; cf. Rm 2.6-11; Ap 20.12,15). Além disso, a apresentação do juízo final em Mateus 25.31-46 inclui Cristo separando as ovelhas dos bodes e recompensando os que recebem sua bênção.
É importante perceber que esse julgamento dos crentes será um julgamento para avaliar e conceder vários graus de recompensa (v. a seguir), mas o fato de que eles enfrentarão um julgamento nunca deveria causar nos crentes qualquer temor de serem eternamente condenados. Jesus diz: “Quem ouve a minha palavra e crê naquele que me enviou, tem a vida eterna e não será condenado, mas já passou da morte para a vida” (Jo 5.24). Aqui a condenação deve ser entendida no sentido de morte e condenação eterna, já que é contrastada com o passar da morte para a vida. No dia do juízo final, mais que em outra oportunidade, é de extrema importância o fato de que “agora já não há condenação para os que estão em Cristo Jesus” (Rm 8.1) . Assim, o dia do juízo pode ser descrito como um dia em que os cristãos serão recompensados e os descrentes, punidos: “As nações se iraram; e chegou a tua ira. Chegou o tempo de julgares os mortos e de recompensares os teus servos, os profetas, os teus santos e os que temem o teu nome, tanto pequenos como grandes, e de destruir os que destroem a terra” (Ap 11.18).
Todas as palavras secretas, todos os atos dos crentes e todos os seus pecados serão revelados no último dia? Poderíamos pensar no princípio assim, porque, escrevendo aos crentes a respeito do dia do juízo, Paulo diz que, quando o Senhor voltar, “ele trará à luz o que está oculto nas trevas e manifestará as intenções dos corações. Nessa ocasião, cada um receberá de Deus a sua aprovação” (lCo 4.5; cf. Cl 3.25). Todavia, esse é um contexto que fala a respeito da recomendação ou louvor (gr., epainos) que vem de Deus, podendo não se referir aos pecados. E outros versículos sugerem que Deus nunca mais chamará nossos pecados à lembrança: “atirarás todos os nossos pecados nas profundezas do mal” (Mq 7.19); “e como o Oriente está longe do Ocidente, assim ele afasta para longe de nós as nossas transgressões” (Sl 103.12); “Sou eu, eu mesmo, aquele que apaga suas transgressões, por amor de mim, e que não se lembra mais de seus pecados” (Is 43.25); “Porque eu lhes perdoarei a maldade e não me lembrarei mais dos seus pecados” (Hb 8.12; cf. 10.17).
De qualquer forma, o fato de que compareceremos perante Deus para que nossa vida seja avaliada será um motivo para vivermos piedosamente, e Paulo usa-o desse modo em 2Coríntios 5.9,10: “Por isso, temos o propósito de lhe agradar, quer estejamos no corpo, quer o deixemos. Pois todos nós devemos comparecer perante o tribunal de Cristo, para que cada um receba de acordo com as obras praticadas por meio do corpo, quer sejam boas quer sejam más”. Mas essa perspectiva não deve jamais causar terror ou alarme na vida dos crentes, porque mesmo os pecados que serão tornados públicos naquele dia já foram perdoados, e por isso eles serão uma oportunidade para dar glória a Deus pela riqueza de sua graça.
A Escritura também ensina que haverá graus de recompensa para os crentes. Paulo encoraja os coríntios a ser cuidadosos quanto a edificar a igreja sobre o fundamento que já havia sido lançado — o próprio Jesus Cristo.
Se alguém constrói sobre esse alicerce usando ouro, prata, pedras preciosas, madeira, feno ou palha, sua obra será mostrada, porque o Dia a trará à luz; pois será revelada pelo fogo, que provará a qualidade da obra de cada um. Se o que alguém construiu permanecer, esse receberá recompensa. Se o que alguém construiu se queimar, esse sofrerá prejuízo; contudo, será salvo como alguém que escapa através do fogo ( lCo 3.12-15).
Semelhantemente, Paulo diz dos cristãos: “Pois todos nós devemos comparecer perante o tribunal de Cristo, para que cada um receba de acordo com as obras praticadas por meio do corpo, quer sejam boas quer sejam más” (2Co 5.10), sugerindo novamente a idéia de graus de recompensa pelo que fizemos nesta vida. Igualmente, na parábola das minas, foi dito ao que fez render dez minas: “Muito bem, meu bom servo! [...] Por ter sido confiável no pouco, governe sobre dez cidades”. Ao que fez render cinco minas, foi dito: ”Também você, encarregue-se de cinco cidades” (Lc 19.17,19). Muitas outras passagens igualmente ensinam ou sugerem graus de recompensa para os crentes no juízo final.
Mas devemos nos precaver contra qualquer entendimento errôneo neste ponto. Embora saibamos que haverá graus de recompensa nos céus, a alegria de cada pessoa será plena e completa pela eternidade. Se perguntarmos como isso pode acontecer, quando há diferentes graus de [O ensino da Bíblia sobre os graus de recompensa no céu é mais amplo do que os cristãos normalmente percebem: Dn 12.2; Mt 6.20,21; 19.21; Lc 6.22,23; 12.18-21,32,42-48; 14.13,14; lCo 3.8; 9.18; 13.3; 15.19,29-32,58; Gl 6.9,10; Ef 6.7,8; Cl 3.23,24; lTm 6.18; Hb 10.34,35; 11.10,14-16,26,35; lPe 1.4; 2João 8; Ap 11.18; 22.12; cf. tb. Mt 5.46; 6.2-6,16-18,24; Lc 6.35.] recompensa, tal fato demonstrará que nossa percepção de alegria é baseada na suposição de que a alegria depende do que possuímos, ou da posição ou poder que temos. Na realidade, contudo, nossa verdadeira alegria consiste em ter prazer em Deus e em regozijar-nos na posição e no reconhecimento que ele nos deu. A tolice de pensar que somente os que foram altamente recompensados e que receberam posição elevada é que serão plenamente felizes no céu é vista quando percebemos que, não importa quão grande seja a recompensa que nos for dada, haverá sempre aqueles com recompensas maiores ou que possuem posição e autoridade maiores, incluindo os apóstolos, as criaturas celestiais, Jesus Cristo e o próprio Deus. Portanto, se a posição mais elevada fosse essencial para as pessoas serem felizes, ninguém seria mais feliz que Deus no céu, o que é certamente uma idéia incorreta. Além disso, aqueles com recompensa e honra maiores no céu, os mais próximos do trono de Deus, teriam prazer não na posição, mas somente no privilégio de se prostrarem diante do trono de Deus para adorá-lo (v.Ap 4.10,11).
Seria moral e espiritualmente benéfico que adquiríssemos uma consciência maior desse ensino claro do NT sobre os graus de recompensa celestial. Ao invés de nos tornar competitivos uns com os outros, ele despertaria em nós o senso de ajudar e de encorajar uns aos outros para que todos pudéssemos aumentar nossa recompensa celestial, pois Deus tem capacidade infinita de trazer bênçãos a nós todos, e todos nós somos membros uns dos outros (v. lCo 12.26,27). Devemos atentar com fervor à admoestação do autor de Hebreus: “E consideremos uns aos Outros para nos incentivarmos ao amor e às boas obras. Não deixemos de reunir-nos como igreja, segundo o costume de alguns, mas procuremos encorajar-nos uns aos outros, ainda mais quando vocês vêem que se aproxima o Dia” (Hb I0.24,25). Ademais, o coração sincero ansiando por recompensa celestial nos motivaria ao trabalho muito sincero para o Senhor em qualquer tarefa para a qual ele nos chamasse, seja grande seja pequena, recebendo salário ou não. Isso também nos faria desejosos de sua aprovação antes que de riqueza ou sucesso e nos motivaria a trabalhar na edificação da igreja sobre o único fundamento, Jesus Cristo (lCo 3.10-15).
4. Os anjos serão julgados.
Pedro diz que os anjos rebeldes foram lançados no inferno ,”a fim de serem reservados para o juízo” (2Pe 2.4) , e Judas diz que os anjos rebeldes foram guardados por Deus sob trevas “para o juízo do grande Dia” (Jd 6). Isso significa que ao menos os anjos rebeldes ou demônios também estarão sujeitos ao juízo no último dia.
A Escritura não indica claramente se os anjos santos também estarão sob uma espécie de avaliação por seus serviços, mas é possível que estejam incluídos na afirmação de Paulo : “Vocês não sabem que havemos de julgar os anjos?’ (lCo 6.3) . É provável que isso inclua anjos santos, porque não há nenhuma indicação no contexto de que Paulo esteja falando de demônios ou anjos caídos, e a palavra anjos sem qualquer qualificação adicional no NT deve ser normalmente entendida como referência aos anjos santos. Mas o texto não é explícito o suficiente para que tenhamos certeza do que afirmamos.
D. A necessidade do juízo final
Desde que os crentes passam imediatamente para a presença de Deus quando morrem e que os descrentes passam para o estado de separação de Deus, suportando a punição quando morrem, podemos nos espantar pelo fato de Deus ter um tempo de juízo final estabelecido. Berkhof sabiamente assinala que o juízo final não tem o propósito de permitir que Deus conheça a condição de nosso coração ou o padrão de conduta de nossa vida, pois ele já sabe tudo isso em todos os detalhes. Em vez disso, Berkhof comenta, sobre o juízo final:
Seu propósito é, antes, expor diante de todas as criaturas racionais a glória declarativa de Deus num ato formal e forense que, por um lado, engrandecerá a Sua santidade e justiça, e, por outro lado, engrandecerá a Sua graça e misericórdia. Ademais, devemos ter em mente que o juízo do último dia será diferente daquele que ocorre na morte de cada indivíduo em mais de um aspecto. Não será secreto, mas público; não terá referência a um só indivíduo, mas a todos os homens.
E. A justiça de Deus no juízo final
A Escritura afirma claramente que Deus será totalmente justo no seu juízo e ninguém será capaz de reclamar qualquer coisa perante ele naquele dia. Deus é aquele que “julga imparcialmente as obras de cada um’ (lPe 1.17), e “em Deus não há parcialidade” (Rm 2.11; cf. Cl 3.25). Por essa razão, no último dia, que “toda boca se cale e todo o mundo esteja sob o juízo de Deus” (Rm 3.19), sendo que ninguém será capaz de reclamar que Deus o tratou com injustiça. De fato, uma das grandes bênçãos do juízo final será que os santos e anjos verão a justiça pura de Deus sendo absolutamente demonstrada, e isso será uma fonte de louvor a ele por toda a eternidade. No tempo do juízo, haverá grande louvor no céu, pois João diz: “Depois disso ouvi nos céus algo semelhante à voz de uma grande multidão, que exclamava: ‘Aleluia! A salvação, a glória e o poder pertencem ao nosso Deus, pois verdadeiros e justos são os seus juízos”’ (Ap 19.1,2).
F. Aplicação moral do juízo final
A doutrina do juízo final tem diversas influências morais positivas em nossa vida.
1. A doutrina do juízo final satisfaz nosso senso interior de necessidade de justiça no mundo.
O fato de que haverá o juízo final assegura-nos de que o universo de Deus em última
análise é justo, pois Deus está no controle e mantém os registros exatos, tornando justo o juízo. Quando Paulo admoesta os escravos para que sejam submissos aos senhores, lhes assegura: “Quem cometer injustiça receberá de volta injustiça, e não haverá exceção para ninguém” (Cl 3.25). Quando o quadro do juízo final menciona o fato de que ”livros foram abertos” (Ap 20.12; cf. Ml 3.16), isso nos lembra (sejam os livros literais ou simbólicos) que o registro permanente e exato de todos os nossos atos foi guardado por Deus, e finalmente todas as contas serão acertadas e todos serão tornados justos.
2. A doutrina do juízo final capacita-nos a perdoar a outros livremente.
Percebemos que não cabe a nós vingar-nos dos que erraram contra nós, ou mesmo querer fazê-lo, porque Deus reservou esse direito para si próprio.”Amados, nunca procurem vingar-se, mas deixem com Deus a ira, pois está escrito : ’Minha é a vingança; eu retribuirei’, diz o Senhor” (Rm 12.19). Desse modo, sempre que alguém nos prejudicar, devemos deixar nas mãos de Deus o desejo de dar o troco à pessoa que errou contra nós, sabendo que cada erro no universo será finalmente cobrado — será eliminado por ter sido pago por Cristo quando ele morreu na cruz (se o malfeitor se torna cristão), ou será cobrado no juízo final (pago por quem não confiou em Cristo para ser salvo). Mas, em qualquer um dos casos, podemos entregar a situação nas mãos de Deus e então orar para que o malfeitor venha a confiar em Cristo e, desse modo, receba perdão de seus pecados. Esse pensamento deveria guardar-nos de armazenar amarguras ou ressentimentos em nosso coração por injustiças que sofremos quando as coisas não foram feitas corretamente: Deus é justo, e podemos deixar essas situações nas suas mãos, sabendo que algum dia ele corrigirá todos os erros e dará recompensas e punições justas. Desse modo, estamos seguindo o exemplo de Cristo: “Quando insultado, não revidava; quando sofria, não fazia ameaças, mas entregava-se àquele que julga com justiça” (lPe 2.23). Ele também orou: “Pai, perdoa-lhes, pois não sabem o que estão fazendo” (Lc 23.34; cf.At 7.60, quando Estêvão seguiu o exemplo de Jesus orando por aqueles que o matavam).
3. A doutrina do juízo final motiva-nos a viver retamente.
Para os crentes, o juízo final é um incentivo à fidelidade e boas obras; não serve como um meio para obter perdão de pecados, mas como meio de ganhar recompensa eterna maior. Esse é um motivo saudável e positivo para nós — Jesus nos diz: “acumulem para vocês tesouros nos céus” (Mt 6.20) —, embora essa idéia bata de frente com o conceito popular de nossa cultura secular, uma cultura que realmente não crê de forma nenhuma no céu ou nas recompensas eternas.
Para os descrentes, a doutrina do juízo final ainda proporciona algum refreamento moral em suas vidas. Se na sociedade há reconhecimento geral e difundido de que todos algum dia darão contas ao Criador do universo de suas vidas, algum “temor de Deus” vai caracterizar a vida de muitas pessoas. Ao contrário, os que não possuem nenhuma consciência profunda do juízo final se entregarão à pratica do mal em escala cada vez maior, demonstrando que aos “seus olhos é inútil temer a Deus” (Rm 3.18). Sobre os que negam o juízo final, Pedro diz que são “escarnecedores”: “Antes de tudo saibam que, nos últimos dias, surgirão escarnecedores zombando e seguindo suas próprias paixões. Eles dirão: ‘O que houve com a promessa da sua vinda?”’ (2Pe 3.3,4). A consciência do juízo final é conforto para os crentes e advertência aos descrentes para não continuarem em seus maus caminhos.
4. A doutrina do juízo final proporciona grande motivo para a evangelização.

As decisões feitas pelas pessoas nesta vida afetarão o destino delas por toda a eternidade, e é correto que nosso coração sinta e que nossa boca ecoe o mesmo sentimento de apelo a Deus que vemos em Ezequiel: “Voltem-se dos seus maus caminhos! Por que o seu povo haveria de morrer, ó nação de Israel?” (Ez 33.11). De fato, Pedro salienta que o retardamento do retorno do Senhor é devido ao fato de que Deus “é paciente com vocês, não querendo que ninguém pereça, mas que todos cheguem ao arrependimento” (2Pe 3.9).
G. Inferno
 É oportuno discutir a doutrina do inferno em conexão com a doutrina do juízo final. Podemos definir o inferno da seguinte maneira: Inferno é o lugar de punição eterna e consciente destinado ao ímpio. A Escritura ensina em diversas passagens que tal lugar existe. No final da parábola dos talentos, o senhor diz: “E lancem fora o servo inútil, nas trevas, onde haverá choro e ranger de dentes” (Mt 25.30). Essa é uma entre as diversas indicações de que haverá consciência de punição após o julgamento final. Semelhantemente, no juízo o rei dirá a alguns: “Malditos, apartem-se de mim para o fogo eterno, preparado para o Diabo e os seus anjos” (Mt 25.41), e Jesus diz que esses assim condenados “irão para o castigo eterno, mas os justos para a vida eterna” (Mt 25.46). Nesse texto, o paralelo entre “vida eterna” e “castigo eterno” indica que ambos os estados são eternos.
Jesus refere-se ao inferno como “fogo que nunca se apaga” (Mc 9.43) e diz que o inferno é o lugar onde “o seu verme não morre, e o fogo não se apaga” (Mc 9.48). A história do rico e de Lázaro também indica uma consciência horrível da punição: ”Chegou o dia em que o mendigo morreu, e os anjos o levaram para junto de Abraão. O rico também morreu e foi sepultado. No Hades, onde estava sendo atormentado, ele olhou para cima e viu Abraão de longe, com Lázaro ao seu lado. Então, chamou-o: ‘Pai Abraão, tem misericórdia de mim e manda que Lázaro molhe a ponta do dedo na água e refresque a minha língua, porque estou sofrendo muito neste fogo”’ (Lc 16.22-24). Então ele suplica a Abraão: “manda Lázaro ir à casa de meu pai, pois tenho cinco irmãos. Deixa que ele os avise, a fim de que eles não venham também para este lugar de tormento” (Lc 16.28).
Quando nos voltamos para o Apocalipse, as descrições da punição eterna são também muito
explícitas: Um terceiro anjo os seguiu, dizendo em alta voz: “Se alguém adorar a besta e a sua imagem e receber a sua marca na testa ou na mão, também beberá do vinho do furor de Deus que foi derramado sem mistura no cálice da sua ira. Será ainda atormentado com enxofre ardente na presença dos santos anjos e do Cordeiro, e a fumaça do tormento de tais pessoas sobe para todo o sempre. Para todos os que adoram a besta e a sua imagem, e para quem recebe a marca do seu nome, não há descanso, dia e noite’» (Ap 14.9-11).
Essa passagem afirma claramente a idéia da punição consciente e eterna dos descrentes.
Com respeito ao juízo sobre a cidade ímpia da Babilônia, uma grande multidão no céu grita:
“Aleluia! A fumaça que dela vem, sobe para todo o sempre” (Ap 19.3). Após a rebelião final de Satanás ser esmagada, lemos: “O Diabo, que as enganava, foi lançado no lago de fogo que arde com enxofre, onde já haviam sido lançados a besta e o falso profeta. Eles serão atormentados dia e noite, para todo o sempre” (Ap 20.10). Essa passagem é também importante em associação com Mateus 25.41, na qual os descrentes são enviados “para o fogo eterno, preparado para o Diabo e os seus anjos”. Esses versículos devem fazer-nos perceber a imensidão do mal que é encontrado no pecado e na rebelião contra Deus e também a magnitude da santidade e da justiça de Deus que provoca essa espécie de punição.
A idéia de que haverá a consciência de punição eterna dos descrentes tem sido negada recentemente mesmo por alguns teólogos evangélicos. Ela havia sido negada anteriormente pela Igreja Adventista do Sétimo Dia e por diversos indivíduos por toda a história da igreja. Os que negam a punição eterna consciente muitas vezes advogam o ”aniquilacionismo”, ensino segundo o qual, após os ímpios terem sofrido a penalidade da ira de Deus por algum tempo, Deus os aniquilará, de modo que passarão a não mais existir. Muitos que crêem no aniquilacionismo também sustentam a realidade do juízo final e da punição pelo pecado, mas argumentam que, após os pecadores terem sofrido por certo período de tempo, suportando a ira de Deus contra seus pecados, eles finalmente cessarão de existir. A punição será, portanto, “consciente” mas não “eterna”.
Os argumentos a favor do aniquilacionismo são: 1) as referências bíblicas à destruição do ímpio, que, dizem alguns, sugerem que eles não mais vão existir após serem destruídos (Fp 3.19; lTs 5.3; 2Ts 1.9; 2Pe 3.7); 2) a aparente incompatibilidade entre a punição eterna consciente e o amor de Deus; 3) a aparente injustiça envolvida na desproporção entre os pecados, cometidos no tempo, e a punição, que é eterna; e 4) o fato de que a presença contínua de criaturas más no universo de Deus desfigurará eternamente a perfeição do universo que Deus criou para refletir sua glória.
Em resposta, 1) deve ser dito que as passagens que falam de destruição (como Fp 3.19; lTs 5.3; 2Ts 1.9; 2Pe 3.7) não implicam necessariamente cessação de existência, pois nessas passagens o termo usado para “destruição” não significa necessariamente o fato de cessar de existir ou uma espécie de aniquilação, mas podem simplesmente ser o modo de referir-se aos efeitos danosos e destrutivos do juízo final sobre os descrentes.
2) Com respeito ao argumento do amor de Deus, a mesma dificuldade de conciliar o amor de Deus com a punição eterna parece estar presente também na conciliação do amor de Deus a idéia da punição divina e, ao contrário, se (como a Escritura testifica abundantemente) é coerente Deus punir o ímpio por determinado tempo após o juízo final, parece que não há razão necessária pela qual seja incoerente Deus infligir a mesma punição para um período de tempo sem fim.
Essa espécie de raciocínio pode conduzir certas pessoas a adotar outra espécie de aniquilacionismo, aquele segundo o qual não há sofrimento consciente de forma alguma, nem mesmo por um tempo breve, e a única punição é que os descrentes cessam de existir após a morte. No entanto, em resposta, é questionável se essa espécie de aniquilacionismo imediato e realmente ser chamado punição, desde que não haveria qualquer consciência de dor. De fato, a garantia de haver a cessação de existência poderia apresentar-se a muitos, especialmente que estão sofrendo e em dificuldade nesta vida, como alternativa de alguma forma desejável.
E, se não há punição de descrentes de espécie alguma, mesmo pessoas como Hitler e Stalin não receberiam castigo algum, e não haveria qualquer justiça final no universo. Assim, as pessoas seriam incentivadas a permanecer tão ímpias quanto fosse possível nesta vida.
3) O argumento de que a punição eterna é injusta (porque há uma desproporção entre o pecado temporário e a punição eterna) presume erroneamente que nós conhecemos o grau do mal cometido quando os pecadores se rebelam contra Deus. David Kingdon observa: “... pecado contra o Criador é nefando até ao ponto de estar totalmente além nossa imaginação [capacidade] pervertida pelo pecado poder conceber [...] Quem poderia temerariamente sugerir a Deus como a punição [...] deveria ser?”. Ele também responde a essa indagação propondo que os descrentes no inferno podem continuar a pecar e receber punição por seus pecados, mas nunca se arrependerão, e observa que Apocalipse 22.11 aponta nessa direção: “Continue o injusto a praticar injustiça; continue o imundo na imundícia”.
4. Considerando o quarto argumento, embora o mal que permanece sem punição prejudique a glória de Deus no universo, também devemos perceber que, quando Deus pune o mal e triunfa sobre ele, a glória da sua justiça, retidão e poder de triunfar sobre toda a oposição será vista (v. Rm 9.17,22-24).A profundidade das riquezas da misericórdia de Deus será então revelada, pois todos os pecadores redimidos reconhecerão que eles também merecem tal punição de Deus e a evitaram somente por causa da graça de Deus por meio de Jesus Cristo (cf. Rm 9.23,24).
Todavia, após tudo isso ter sido dito, devemos admitir que a resolução final das profundezas dessa questão repousa muito além de nossa capacidade de entender e permanece escondida nos conselhos de Deus. Se não fosse pelas passagens da Escritura citadas antes que afirmam tão claramente a punição consciente e eterna, o aniquilacionismo poderia parecer a opção bem mais atraente. Embora o aniquilacionismo possa ser contrariado por argumentos teológicos, a clareza e o vigor das passagens em si mesmas é que nos convencem de que o aniquilacionismo é incorreto e que a Escritura de fato ensina sobre a punição eterna que o ímpio sofre conscientemente.
O que devemos pensar a respeito dessa doutrina? É difícil — e deve ser difícil — pensarmos a respeito dessa doutrina hoje. Se nosso coração nunca é tocado com tristeza profunda quando contemplamos essa doutrina, é porque há uma deficiência séria em nossa sensibilidade espiritual e emocional. Quando Paulo pensa a respeito da perdição de seus concidadãos, os judeus, ele diz: “tenho grande tristeza e constante angustia em meu coração” (Rm 9.2). Isso esta de acordo com o que Deus nos diz de sua tristeza com respeito à morte do ímpio: “Juro pela minha vida, palavra do Soberano, o SENHOR, que não tenho prazer na morte dos ímpios, antes tenho prazer em que eles se desviem dos seus caminhos e vivam. Voltem! Voltem dos seus maus caminhos! Por que o seu povo haveria de morrer, ó nação de Israel?” (Ez 33.11). A agonia de Jesus fica evidente quando ele chora: “Jerusalém, Jerusalém, você, que mata os profetas e apedreja os que lhe são enviados! Quantas vezes eu quis reunir os seus filhos, como a galinha reúne os seus pintinhos debaixo das suas asas, mas vocês não quiseram. Eis que a casa de vocês ficará deserta’ (Mt 23.37,38; cf. Lc 19.41,42).
A razão de ser difícil pensarmos sobre essa doutrina é porque Deus colocou em nosso coração uma porção do próprio amor pelas pessoas criadas à sua imagem, até mesmo o seu amor por pecadores que se rebelam contra ele. Enquanto estivermos nesta vida, quando pensarmos em pessoas que precisam ouvir do evangelho e confiar em Cristo para serem salvas, é natural que cause em nós grande angústia e agonia de espírito só pensarmos a respeito da punição eterna. Todavia, devemos também compreender que qualquer coisa que Deus em sua sabedoria tenha ordenado e ensinado na Escritura está correto. Portanto, devemos ter cuidado para não odiar sua doutrina ou nos rebelarmos contra ela, mas antes procurarmos, tanto quanto formos capazes, chegar ao ponto em que venhamos a reconhecer que a punição eterna é boa e certa, porque em Deus não há injustiça alguma.
Pode ser de ajuda percebermos que, se Deus não exercesse a punição eterna, então certamente sua justiça não seria satisfeita e sua glória não seria promovida da forma que ele julga ser sábio. E talvez seja de maior ajuda ainda percebermos que, da perspectiva do mundo vindouro, há um reconhecimento muito maior da necessidade e do caráter justo da punição eterna. Os crentes martirizados no céu clamam e João registra: “Até quando, ó Soberano, santo e verdadeiro, esperarás para julgar os habitantes da terra e vingar o nosso sangue?” (Ap 6.10). Além disso, na destruição final da Babilônia, a voz audível da grande multidão no céu clama com louvor a Deus pela retidão de seus juízos quando a multidão percebe finalmente a natureza hedionda do mal como ele realmente é:
“Aleluia! A salvação, a glória e o poder pertencem ao nosso Deus, pois verdadeiros e justos são os seus juízos. Ele condenou a grande prostituta que corrompia a terra com a sua prostituição. Ele cobrou dela o sangue dos seus servos’. [...] Aleluia! A fumaça que dela vem, sobe para todo o sempre” (Ap 19.1-3). Tão logo isso aconteceu, os “vinte e quatro anciãos e os quatro seres viventes prostraram-se e adoraram a Deus, que estava assentado no trono, e exclamaram: ‘Amém, Aleluia!’’ (Ap 19.4). Não podemos dizer que essa grande multidão de redimidos e de criaturas viventes no céu fazem um julgamento moral errado quando louvam a Deus por exercer a sua justiça sobre o mal, porque eles estão livres de qualquer pecado e os seus juízos morais são agradáveis a Deus. Eles sem dúvida vêem muito mais claramente que nós quão terrível o pecado realmente é.
Nesta presente era, contudo, somente devemos abordar tal celebração da punição do mal quando meditamos na punição eterna dada a Satanás e seus demônios. Quando pensamos neles, instintivamente não os amamos, embora eles também tenham sido criados por Deus. Mas agora eles são plenamente dedicados ao mal e estão além da possibilidade de redenção. Assim, não podemos ansiar pela salvação deles como ansiamos pela redenção da humanidade. Devemos crer que a punição eterna é verdadeira e justa, todavia devemos também desejar que mesmo os que perseguem a igreja mais severamente se cheguem com fé a Cristo e, dessa forma, escapem da condenação eterna.
Autor: Wayne Grudem
Fonte: Teologia Sistemática do autor, Ed. Vida Nova